Correio Brasília

 

Apresentamos a poeta Simone Teodoro

17/05/2016 18:40

 

Autora dos livros de poemas Movimento em falso (Patuá, 2016) e Distraídas astronautas(Patuá, 2014), Simone Teodoro nasceu em Belo Horizonte no início da década de 1980, num 31 de janeiro que, como muita gente deve saber, é o dia Internacional do Mágico. Ainda cedo foi iniciada pela mãe na arte das gambiarras. Passou a infância quase toda consertando coisas, principalmente os frágeis radinhos à pilha que comprava no camelô, com as moedinhas que juntava. Para ela a vida não tinha graça se não houvesse canções. Anos mais tarde fez aulas de artes marciais. Desistiu rápido e decidiu seguir carreira religiosa: foi católica carismática e quase irmã carmelita. Não deu certo. Cresceu. Estudou letras na Universidade Federal de Minas Gerais. Foi professora de literatura. Em 2013 ingressou no mestrado na mesma instituição. Atualmente coordena as atividades de incentivo à leitura da Biblioteca Pública Infantil e Juvenil de Belo Horizonte. Mantém o blog calidapoesia.blogspot.com.br, onde publica, sem disciplina alguma, seus textos. Poderia ter sido engenheira, lutadora de MMA, freira ou saxofonista. Mas uma vida só não basta. É poeta.

Conheça 05 poemas do livro Movimento em falso, de Simone Teodoro:

 

Desordem


Porque ela passou 
por aqui
dentro de mim tudo é
desordem.

Porque ela passou
por aqui
-Estação de loucura-


não há temperatura
em que eu não seja febre


não há voz
em que eu não seja
grito


Porque ela passou
por aqui


há apenas
a dor
da pele
cortada à volúpia.

 

***

 

Lugar



Aqui
onde foi abolido o hímen
úmido Hífen 
que nos separava


Aqui
onde a língua é dinâmica
e dedos são talheres


Aqui
onde o grelo
destrona o falo

É rijo
É lindo
É talo

 

***

 

Por equinócios e solstícios vários


Eu te supunha
Asa
Hélice
Um retalhar de quedas

Eu te sonhava
Rito e rio
E te queria ajustada
A meu dia de chuva
E a minha saudade de árvores

Por equinócios e solstícios vários
Te gozei
Em poro e pelo

Mas eu era a puta
Eu era a puta
E você tinha 
A pedra
E a estaca

Por equinócios e solstícios vários
Nos esfaqueamos
Com furor igual
Ao de quando o desejo
Nos delirava

Por equinócios e solstícios vários

Até que o sal
Do mar da mágoa
Vestiu de ardência
Nossas carnes rasgadas

 

***

 

Balada para Vita Sackville-West
 

I

 

Sigo
pela calçada suja
da madrugada

Tão confortável
como se fosse um rapaz

Calças largas
camuflam
as coxas

Mãos nos bolsos
Cabelos curtos

Tão confortável
como se fosse um rapaz

Homem nenhum
tem ganas 
de devorar-me

Levo uns rabiscos
no meu embornal

mas, 
oh
e se desconfiam
que tenho boceta
no lugar de um pau?

Piso a calçada mijada
-Segura-
Como se fosse um rapaz
 

II


No poema 
que iniciei há quatro séculos
uma tristeza puta
cuidadosamente
alfinetada

Há quatro séculos
expurgando versos de abismos

Há quatro séculos
chorando a princesa russa
que desliza
para sempre
numa pista de gelo.

Há quatro séculos
cultivo um carvalho
dentro do meu embornal

Mas, 
oh
e se desconfiam 
que tenho boceta
no lugar de um pau?
 

***

 

Liturgia

 

Chove constantemente
em meu sonho

Mas aqui
Onde tudo é real

Há, por vezes,
Uma dureza cinza de asfalto

E o sol não tem cabelos
Como num desenho 
de infância

O lilás interrompe
a rotina das nuvens

Um nome se repete
na memória
Tal qual mantra
Liturgia

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